Agentes Agroflorestais Indígenas (AAFIs) representantes de 13 povos de 23 Terras Indígenas (TI) no Acre estarão por mais de 30 dias no Centro de Formação dos Povos da Floresta (CFPF), em Rio Branco, participando do XXVI Curso de Formação de AAFIs, que iniciou nesta segunda-feira, 14, e segue até 16 de novembro. O curso que acontece anualmente é coordenado pela Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-Acre) em parceria com a Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIAC), e recebe o apoio financeiro do Fundo Amazônia/BNDES, por meio do Projeto Experiências Indígenas de Gestão Territorial e Ambiental no Acre.
Há 23 anos a CPI-Acre trabalha com a formação de AAFIs. Para isso criou o Centro de Formação dos Povos da Floresta (CFPF) que é uma escola com unidades demonstrativas de sistemas agroflorestais (SAFs) e de criação de animais domésticos e silvestres, viveiros, hortas, etc. Em 2009, com o reconhecimento do Conselho Estadual de Educação do Acre o CFPF passou a emitir também certificado como ensino médio técnico profissionalizante.
Nos próximos dias, os indígenas cumprirão uma carga horária de 325 horas/aula distribuída nas disciplinas de Criação e Manejo de Animais Doméstico e Silvestre; Cartografia Indígena; Ecologia Indígena; Horta Orgânica; Artes e Ofício, Língua Indígena e Portuguesa; Matemática; Educação Ambiental – Saneamento básico e Cuidado com o Lixo; Fundamentos Diretrizes da Função do AAFI, Informática e Agrofloresta. Embora o curso intensivo seja anual, a formação de AAFIs acontece ao longo do ano por meio das redes de intercâmbio, oficinas e assessorias realizadas em suas terras indígenas.
Há no Acre 192 AAFIs representantes de todos os povos indígenas de 31 TIs no estado, entre eles Orlean Marcos Ferreira, da TI do Caucho, que foi escolhido pela comunidade para ser AAFI há dois anos e é um dos três estudantes que está iniciando a formação. Na TI, Orlean anima as ações de gestão territorial e ambiental, acompanha os plantios de SAFs auxiliando as famílias, participa das reuniões de lideranças, realiza vigilância do território e é um educador ambiental nas escolas e em toda comunidade “De tudo eu sei fazer um pouco, mas tenho muita facilidade para lidar com horta, plantios e manejo de SAFs. Quero sair desse curso conhecendo ainda mais, com novas experiências”, conta Orlean.
Já Antônio Banê de Carvalho Kaxinawá, da TI Kaxinawá Nova Olinda, está no sexto curso de formação. Outros 13 AAFIs se dedicam à monografia de conclusão do curso, que são orientadas por professores da CPI-Acre e professores consultores da Universidade Federal do Acre (UFAC), Universidade Federal do Rondônia (UNIR) e Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB). “Foram nos anos que passei aqui que aprendi a ser porta voz da comunidade, a levar o que aprendemos aqui, porque a gente sai como um professor também, um educador para trabalhar com as crianças, jovens, parteiras, artesãs, agentes de saúde, pajés da medicina e outros professores. O AAFI para ser um bom educador precisa ter um SAF para receber a comunidade, somos o espelho da comunidade, para que todos possam fazer igual”, explica Antônio Banê.
Conhecimentos tradicionais e ocidentais
Nesta primeira semana de curso estão sendo ministradas as disciplinas de Horta Orgânica e Cartografia Indígena. “Em todos os módulos trabalha-se os conhecimentos tradicional e ocidental e se discute como o encontro desses conhecimentos ajuda na proteção dos territórios”, explica Renato Antonio Gavazzi, coordenador pedagógico do Curso de Formação de AAFIs.
Na semana seguinte, Joaquim Maná Kaxinawá, que é o primeiro professor indígena com o título de doutor em linguística pela Universidade de Brasília (UnB), ministrará a disciplina Língua Indígena com o grupo de AAFIs Huni Kuĩ. Aos 20 anos de idade, Maná foi alfabetizado na língua portuguesa no magistério indígena da CPI-Acre e agora o professor retorna à sala de aula para trabalhar com a gramática da língua Hãtxa Kuĩ. Outro convidado que também cursou o magistério indígena na CPI-Acre e estará na curso na disciplina Artes e Ofício é o artista plástico Ibã Kaxinawá. Nos anos anteriores, os AAFIs dedicaram-se à confecções de artefatos em madeira, criaram de esculturas mitológicas à móveis variados. Desta vez, a aula será sobre ilustração e pintura em tela com tinta acrílica a partir de mitos.
“O curso é um momento importante porque reúne muitas pessoas que trabalham conosco há mais de duas décadas. Somos a única instituição no Brasil que por tantos anos trabalha na formação de agentes agroflorestais indígenas. Eles retornam para as TIs e aplicam o conhecimento com a comunidade, pois este trabalho não é só discutido, ele é implementado. Os AAFIs implementam modelos de gestão ambiental na linha da sustentabilidade e nos últimos 23 anos deram contribuições enormes às TIs, enriquecendo-as com grande variedade de frutas e outras alternativas para melhoria nutricional e melhoria da alimentação, além da proteção da floresta Amazônica”, diz Renato. Segundo o coordenador, que acompanha a formação de AAFIs desde o primeiro curso, “os indígenas no Acre tem uma tradição milenar de agricultura, com grandes roçados e plantios e eles querem continuar nesse trabalho de uma agricultura orgânica, que não contamina o meio ambiente e as pessoas”.
O XXVI Curso de Formação de AAFIs é uma das ações do projeto Experiências Indígenas de Gestão Territorial e Ambiental no Acre, comtemplados na Chamada Pública PNGATI, de 2015, financiando pelo Fundo Amazônia/BNDES e executado pela Comissão Pró- Índio Acre (CPI-Acre), em parceria com a Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIAC) e as associações de oito Terras Indígenas no Acre. O principal objetivo do projeto Experiências é apoiar os processos de implementação dos Planos de Gestão Territorial e Ambiental (PGTAs) desses territórios, por meio da formação e trabalho de Agentes Agroflorestais Indígenas, incluindo a promoção de ações de proteção e vigilância territorial, manejo de quintais e sistemas agroflorestais, de resíduos sólidos e a instalação de 52 pontos de captação de água pluvial nessas 8 terras indígenas, com sistemas simples e adequados às comunidades. (Comunicação/CPI-Acre)