Produção dos SAFs da Aldeia Água Viva, TI Kaxinawá da Praia do Carapanã (Foto Renato Gavazzi)

Por Felipe Araújo*

O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) estabelece que pelo menos 30% dos alimentos adquiridos para a merenda escolar das escolas da rede pública devem ser provenientes da agricultura familiar, conforme previsto na Lei 11.947/2009, com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

O PNAE tem como objetivo garantir a segurança alimentar dos estudantes da rede pública e, quando se trata da realidade dos povos habitantes da floresta amazônica há uma série de singularidades às quais esta política pública deve se adaptar. Entre elas a necessidade de os alimentos produzidos em aldeias e comunidades de Terras Indígenas (TIs) e Reservas Extrativistas (RESEXs) serem canalizados para escolas das próprias TIs e RESEX e envolver os produtores residentes nesses territórios. Em 2023, foram contempladas as Terras Indígenas dos seguintes municípios: Assis Brasil (TI Mamoadate e TI Cabeceira do Rio Acre), Mâncio Lima (TI Puyanawa, TI Nawa e TI Nukini), Cruzeiro do Sul (TI Campinas/Katukina) e Feijó (TI Katukina/Kaxinawa).

A Comissão de Alimentos Tradicionais dos Povos do Acre (CATRAPOACRE) foi criada em resposta à determinação do Ministério Público Federal (MPF) e inspirada na experiência da CATRAPOA do Estado do Amazonas. Seu principal objetivo é acompanhar e apoiar a implementação do PNAE, cuja responsabilidade é da Secretaria Estadual de Educação (SEE). A CATRAPOACRE envolve órgãos governamentais e entidades da sociedade civil: Secretaria de Estado de Produção e Agronegócio (SEAGRI), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), Empresa de Assistência Técnica Extrativista Rural (EMATER), FUNAI, Cooperação Técnica Alemã GIZ, Organização dos Professores Indígenas do Acre (OPIAC), Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIAC), SOS Amazônia e Comissão Pró-Indígenas do Acre (CPI-Acre).

Na execução do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) Indígena no Estado do Acre, diversos desafios foram enfrentados, resultando em insatisfação generalizada entre os produtores indígenas que assinaram contrato de fornecimento de alimentos para a merenda escolar. A SEE executou apenas 5,2 % do montante total disponibilizado pelo FNDE para a compra de alimentos de produtores indígenas para a merenda escolar em Terras Indígenas. Isto é, dos R$ 3.404.403,97 disponibilizado por este Fundo em 2023, apenas R$ 175.448,13 foram contratados e executados. Como consequência, 11 organizações indígenas enviaram uma Carta Aberta à SEE e ao MPF denunciando a lentidão da implementação do PNAE em Terras Indígenas. Em novembro de 2023, uma segunda Carta Aberta foi elaborada, desta vez por coordenadores pedagógicos indígenas, professores indígenas e Agentes Agroflorestais Indígenas que participaram da 1ª Oficina sobre Produção Sustentável, Segurança Alimentar e Acesso a Políticas Públicas de Compra de Alimentos, conduzida pela CPI-Acre em parceria com a SEAGRI. Esta Carta apresenta recomendações para o aprimoramento da execução da política a nível estadual.

Para o ano letivo de 2024, a SEE optou por não realizar Chamadas Públicas, propondo um período dedicado a ajustes do PNAE Indígena, durante o qual a CATRAPOACRE pretende aprender com as experiências passadas, especialmente as não exitosas. Nesse sentido, a CATRAPOACRE estabeleceu um Grupo de Trabalho em colaboração com o MPF, visando aprimorar os mecanismos de execução, por parte da SEE, destacando: a necessidade de simplificação do fluxo de pagamento, o maior envolvimento dos indígenas na elaboração dos projetos de venda e a realização de diagnósticos produtivos de qualidade para a formulação das futuras Chamadas Públicas. É crucial reconhecer os impactos desses obstáculos na implementação do PNAE Indígena e incorporar as sugestões apresentadas pelas Cartas Abertas citadas, que podem servir como guias, visto o detalhamento preciso de algumas recomendações.

Produção de banana na TI Katukina/Kaxinawa (Fotos do Antônio Banê)

 

*Assessor técnico do Programa de Gestão Territorial e Ambiental (PGTA) da CPI-Acre