Alimentação disponibilizada aos mamíferos silvestres do Projeto Caboquinho da Mata

Aconteceu entre os dias 20 de agosto e 22 de setembro de 2018, o XXV Curso de Formação de Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre, no Centro de Formação dos Povos da Floresta, em Rio Branco, coordenado pela Comissão Pró-Índio do Acre, com apoio financeiro do Fundo Amazônia/BNDES.

Durante os 34 dias de curso (325 horas-aula), participaram um total de 33 AAFIs, representantes de 9 povos e 17 terras indígenas do Acre. Entre eles, 10 AAFIs estavam participando pela primeira vez de um curso em Rio Branco.

Em um espaço intenso e dinâmico de trocas de saberes, foram desenvolvidos os módulos de Artes e Ofícios, Agrofloresta, Horta Orgânica, Línguas, Educação Ambiental, Arqueologia Indígena, Matemática, Ecologia Indígena, Criação e Manejo de Animais Domésticos e Silvestres, Cartografia Indígena, Fundamentos e Diretrizes Políticas da Função e Produção de Material Didático.

Como parte da Formação em Intercâmbio, os AAFIs fizeram visitas técnicas no contexto da formação profissionalizante. A primeira visita foi ao projeto Caboclinho da Mata, no município de Senador Guiomard. Sob coordenação da professora Vânia Ribeiro da UFAC, este projeto desenvolve técnicas que permitem o manejo racional de algumas espécies de mamíferos silvestres.

“Nessa visita, pela primeira vez tive a oportunidade de ver de perto o porquinho da mata, capivara e cutia. Nos modelos demonstrativos acompanhamos como é a alimentação desses animais e vimos que essa fartura vem do nosso grande mercado, que é a floresta” – AAFI Marcos Brandão, TI Katukina/Kaxinawá.

Os agentes agroflorestais também visitaram o Projeto SOS Quelônios, em Acrelândia. A história do projeto inicia em 2000, quando um grupo liderado por Abrãao Libdy Kerdy navegou pelo Rio Abunã e constatou que os quelônios estavam em processo de extinção. Desde então, o projeto desenvolve um surpreendente trabalho de vigilância e monitoramento das praias de desova. Através do manejo dos ovos em praia de tabuleiro, todos os anos as comunidades da região realizam a soltura de milhares de filhotes em lagos e no rio Abunã (Brasil/Bolívia). Durante o intercâmbio, os AAFIs prestigiaram a soltura de filhotes de tracajá.

Uma coisa que me chamou muito atenção… foi que a luta deles deu frutos. Quando a gente fez o passeio pelo rio Abunã para chegar até a praia de tabuleiro, foi de encher os olhos o tanto de tracajá e tartaruga que avistamos dentro do rio. Este sim é um trabalho parceiro da natureza e um grande exemplo para nós agroflorestais”. – AAFI Antônio de Carvalho, TI Kaxinawá do Nova Olinda.

No módulo de Arqueologia Indígena, os AAFIs visitaram o sítio arqueológico Jacó Sá, localizado na rodovia BR 317. Em campo, foram abordados temas como legislação de proteção do patrimônio cultural brasileiro, morfologia e ecologia da paisagem em áreas de interesse arqueológico e a estruturas componentes do sítio arqueológico visitado.

Dentre as atividades do módulo de Agrofloresta, os AAFIs fizeram o diagnóstico das áreas de SAFs do Centro de Formação, manejaram uma área implantada em 1998, durante o terceiro curso intensivo, e praticaram a recomposição de mata ciliar com espécies de palmeiras, como o buriti, açaí e bacaba. Outro ponto alto foi a condução de uma prática de produção de chocolate pelo AAFI Bane Huni Kuĩ, com as sementes de cacau plantado no próprio Centro de Formação. Cada AAFI relatou ainda como era o SAF na sua aldeia e como vem trabalhando com a comunidade e na escola, como educador ambiental e articulador da gestão territorial e ambiental.

O módulo de Arte e Ofícios também foi trabalhado neste curso. Os móveis e as esculturas produzidas, de grande e pequeno porte, inspiram-se em personagens mitológicos relacionados a seres que protegem o meio ambiente e aos mitos de origem de cada povo. Outra proposta deste módulo é a reutilização de recursos florestais, desenvolvendo alternativas para o reaproveitamento de madeiras caídas na mata e manejadas nas áreas de roçado. Assim ao que antes não tinha conotação econômica, é agregado valor e se torna um produto que pode ser comercializado.

A Exposição de esculturas: “Hi ea miyuishuiki – A madeira me contou“ 

Durante o curso, a Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIAC) organizou a exposição “Hi ea miyuishuiki – A madeira me contou”, na Casa dos Povos Indígenas, em Rio Branco. A iniciativa é parte do projeto “Artes e Ofício – Reutilização de madeira para a confecção de móveis, esculturas e outros objetos de uso”, coordenado pela Associação. Os AAFIs presentes ao XXV curso visitaram a mostra e puderam prestigiar as talentosas produções artísticas desenvolvidas pelos indígenas formados através do projeto. 

Oficina de Coleta de Sementes 

Outra iniciativa da AMAAIAC em parceria com o XXV Curso foi a realização da Oficina de Técnicas de Coletas de Sementes, entre os dias 24 e 26 de setembro, com apoio de convênio firmado entre a Associação e a SEAPROF (Plano de Gestão Fortalecendo a Produção Agroflorestal Indígena do Acre). Durante a oficina foram abordados temas como: famílias e espécies florestais de importância econômica e nutricional, morfologia das sementes, tipos de dispersão, germinação, técnicas de escalada e coleta de sementes em árvores altas. Os AAFIs tiveram a oportunidade de escalar em árvores com o uso de equipamentos de rapel e EPIs (equipamentos de proteção individual) e receberam instruções para subir em árvores com segurança, usando equipamentos tradicionais como peconha e esporão. 

“Todos nós que estamos aqui, estamos em busca de um só objetivo, que é o conhecimento, que depois será levado para nossas aldeias e vai ser trabalhado com as comunidades. Quero agradecer a oportunidade de participação no curso. Vejo que essa turma que convivemos por mais de um mês de trabalho, representa uma família nova que acabamos de construir. Nesse lugar, fizemos um intercâmbio de conhecimentos dos povos indígenas do Acre e somamos com os conhecimentos dos nossos professores não indígenas. A gente aprende em cada momento desta vivência, desde as aulas na teórica e na prática, durante nossas conversas nos alojamentos, viagens, rodadas de cipó. Todo momento é oportunidade para novos conhecimentos e eu só tenho a agradecer” – AAFI Osmildo Kuntanawá, Resex Alto Juruá.