Como continuidade da formação técnica, intercultural, bilíngue e política dos Agentes Agroflorestais Indígenas (AAFIs), com ações que incluem reflexão sobre a prática de uso, manejo e conservação dos recursos naturais, os AAFIs Huni Kuĩ da Terra Indígena (TI) Alto Rio Purus, localizada no município de Santa Rosa do Purus, Acre, receberam assessoria e participaram da Oficina de Meliponicultura realizada nesta TI entre meados de novembro e final de dezembro de 2017. Na ocasião, dois AAFIs da TI Katukina/Kaxinawá, fizeram intercâmbio e participaram das atividades desenvolvidas.

Além dos AAFIs, houve grande participação das comunidades em geral, e especialmente de jovens, professores e crianças. As atividades realizadas visaram o fortalecimento da produção agroflorestal, a promoção da meliponicultura, e o apoio a atuação dos Agentes Agroflorestais junto às suas aldeias, no âmbito da gestão territorial e ambiental.

A criação e manejo de animais silvestres é um dos temas difundidos na formação do AAFI, e no caso da abelha nativa, os povos indígenas tem especial interesse devido a sua múltipla importância para os mesmos, seja por sua contribuição à segurança alimentar, pela possibilidade de diversificação da renda por meio da comercialização do mel e derivados, e ao mesmo tempo em que preserva o ambiente, com a prestação de serviços ambientais (polinização), agregando valor à produção e contribuindo com o equilíbrio ecológico e a manutenção da floresta1.

Durante a Oficina de Meliponicultura, foram realizadas práticas de captura de abelhas nativas, instalação e manutenção de caixas de criação, divisões do enxame e distribuição de caixas para os AAFIs e famílias interessadas em desenvolver e/ ou fortalecer a criação de abelhas sem ferrão. Além da troca de conhecimentos entre os participantes, essa atividade teve como objetivo dar subsídios para que os AAFIs atuem como multiplicadores dessa prática em suas aldeias, promovendo e dando início a organização da cadeia de valor do mel na TI Alto Rio Purus.

Para o fortalecimento da produção agroflorestal de diferentes aldeias foram distribuídos 65 kg de sementes de espécies frutíferas, tais como: açaí touceira, bacaba, cupuaçu, maracujá e manga, provenientes do Centro de Formação dos Povos da Floresta (CFPF), com o intuito de apoiar as ações já desenvolvidas pelos AAFIs junto as comunidades, na produção e distribuição de mudas e ampliação de plantios. Durante a assessoria também foram realizados diagnósticos dos sistemas agroflorestais (SAFs) e avaliação dos modelos demonstrativos dos AAFIs.

Durante as atividades e visitas às aldeias, cada AAFI mostra como faz o seu trabalho. Eu estou registrando tudo no meu diário, não só as práticas de SAF, mas tudo o que a gente faz nas aldeias, como as comunidades, sobre as reuniões, os intercâmbios. Em cada aldeia foi discutido algum assunto sobre o nosso trabalho. Eu acompanhei a oficina na aldeia Nova Aliança e assessoria que foi realizada em cinco aldeia: primeiro na aldeia Novo Repouso, segundo na minha comunidade que é a Nova Família, terceiro na Morada Nova e, depois na aldeia 6 de Julho e na Dois Irmãos. Ficamos uns três dias em cada lugar.

AAFI Rubens Maria – Aldeia Nova Família

Além das atividades mencionadas, foram realizadas discussões e levantamentos sobre outras atividades que os AAFIs junto com as comunidades vem desenvolvendo e buscando parcerias, tais como a piscicultura e quelonicultura, e a produção de farinha, trazendo indicativos de como apoiar o fortalecimento e estruturação da cadeia de valor desses produtos, com o objetivo principal de promover a soberania alimentar e a regionalização da merenda escolar. Algumas aldeias já alcançaram o objetivo de serem os fornecedores da merenda para a escola local e buscam expandir essa experiência para outras comunidades da TI.

O AAFI Ismael Menezes Brandão Shanenawa, membro da diretoria da Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIAC), que foi como convidado para participar de um intercâmbio na TI Alto Rio Purus, realizou reuniões nas aldeias para discutir sobre a função dos AAFIs, fazer repasse e atualização de informações sobre diferentes ações da AMAAIAC durante o ano de 2017, além de ter tido a oportunidade de partilhar de novas experiências para sua própria formação como AAFI durante o período.

Aqui eu fui muito bem recebido em cada comunidade, aprendi um pouco mais sobre a cultura dos Huni Kuĩ, sobre a forma de plantar, que são as mesmas coisas que a gente planta, só que um pouco diferente na hora de plantar e preparar. Trouxe um pouco do que eu sei para ajudar aqui, contar um pouco da minha terra, da minha cultura e ver a organização de vocês.

Ismael Menezes Brandão – Aldeia Shanekaya, TI Katukina/Kaxinawa

O AAFI Antonio José Barbosa Kaxinawa, da aldeia Paroá, da TI Katukina/ Kaxinawa, também participou da viagem à TI Alto Rio Purus, como um intercâmbio para a sua formação. E sobre essa experiência relatou: Apesar de ser do mesmo povo, tem muitas diferenças de uma TI para outra, até de uma aldeia para outra. Estou muito feliz por tá em um lugar onde nossa comida é fortalecida, nossa língua é falada desde as crianças até os mais velhos, participar dos katxanawa, ir nas pescarias, nas nossas festas. Eu vi algumas espécies que já não temos na minha aldeia, eu já conversei para no final levar algumas mudas e sementes daqui.

As assessorias, oficinas e intercâmbios, realizados nas TIs, são modalidades da formação dos Agentes Agroflorestais Indígenas, que permitem um acompanhamento diferenciado do trabalho desenvolvido pelos AAFIs, e possibilitam a convivência com os moradores das diferentes aldeias. Além destas modalidades, também é parte da formação, os cursos presenciais com duração de quatro a cinco semanas, e ocorrem no CFPF, em Rio Branco, Acre.

As ações realizadas nesta viagem estão integradas à gestão territorial e ambiental da TI Alto Rio Purus, com ênfase na agricultura sustentável e na criação de animais para a soberania alimentar. A assistência técnica indígena, promovida por meio da formação e atuação de AAFIs, que são os mediadores da gestão territorial e ambiental junto às suas comunidades, fortalece as práticas indígenas de produção, manejo, uso sustentável e conservação dos recursos naturais.

Estas atividades foram realizadas por meio da parceria entre a Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-Acre), a Organização dos Povos Indígenas Huni Kuĩ do Alto Rio Purus (OPIHARP) e a AMAAIAC, no âmbito do projeto “Cadeias de Valor em Terras Indígenas no Acre”, financiado pelo Fundo Amazônia/ BNDES, e contou com o apoio da Secretaria de Estado de Extensão Agroflorestal e Produção Familiar (SEAPROF/ Acre).

1Empresa Brasileira de pesquisa Agropecuaria (Embrapa). Sistema de criação de abelhas nativas sem ferrão. Disponivel em: https://www.embrapa.br/busca-de-solucoes-tecnologicas/-/produto-servico/1664/sistema-de-criacao-de-abelhas-indigenas-sem-ferrao-meliponicultura. Consultado no 23/01/2018.