Comunicação/CPI-Acre
Associações e organizações indígenas do Acre publicaram nesta terça-feira, 03, uma carta exigindo dos deputados federais e senadores do estado, um posicionamento contrário ao Projeto de Lei (PL) 490/2007, que retira direitos indígenas e na prática pode acabar com a demarcação de Terras Indígenas no país. O PL 490 é um grave ataque à Constituição Federal de 88, permite a degradação ambiental e coloca as terras indígenas para negociação e interesses econômicos sem direito a consulta, além de impor o Marco Temporal, que será votado em agosto no Supremo Tribunal Federal (STF).
Na Carta Aberta das Organizações Indígenas aos Parlamentares do Acre no Congresso Nacional, os indígenas destacam que o PL 490 vai “enfraquecer as comunidades e criar problemas para o desenvolvimento dos modos de vida em um momento em que a preservação ambiental, das florestas e das águas, são importantes para toda a sociedade”.
Contra o PL 490 e o Marco Temporal, os povos indígenas estarão mobilizados entre os dias 22 e 28 de agosto, no acampamento Luta Pela Vida, em Brasília, organizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB). No último dia 16 de julho, com o apoio da Comissão Pró Índio do Acre (CPI-Acre), lideranças indígenas de 10 povos, 13 terras indígenas e 18 organizações reuniram-se em encontro virtual, para debaterem o PL 490 e apresentaram as iniciativas em desenvolvimento para o fortalecimento e ampliação das mobilizações no estado e na capital federal.
“Este PL resume todas as ameaças que tramitavam no Congresso Nacional anteriormente. É um desrespeito muito grande que vivemos desse governo, querem acabar com nossos direitos garantidos pela Constituição. Estão tentando nos calar usando leis, que mexe na nossa terra, por isso a coletividade neste momento é muito importante”, disse durante o encontro virtual, Nedina Yawanawa, coordenadora da SITOAKORE – Organização das Mulheres Indígenas do Acre, Sul do Amazonas e Noroeste de Rondônia.
Leia a Carta na íntegra abaixo:
CARTA ABERTA DAS ORGANIZAÇÕES INDÍGENAS AOS PARLAMENTARES DO ACRE NO CONGRESSO NACIONAL
Senhoras e senhores representantes do Estado do Acre no Congresso Nacional,
Manifestamos nossa preocupação com iniciativas legislativas que pretendem alterar os direitos territoriais indígenas e solicitar vosso posicionamento e voto contrário aos projetos de lei que afrontam nossos direitos.
A Constituição de 1988 reconheceu a luta de nossas lideranças e dos movimentos indígenas ao determinar o respeito aos direitos originários sobre os territórios e a proteção da nossa autodeterminação, modo de vida, cultura, espiritualidade e línguas. Hoje, vemos projetos de lei para alterar o determinado pela Constituição, mudando o que é necessário à demarcação das terras e afrontando o direito de usufruto exclusivo dos territórios.
O Projeto de Lei nº 490/2007 é inconstitucional porque não pode alterar o que está previsto na Constituição. Coloca os territórios em negociação, ao permitir que qualquer interessado ou invasor seja considerado e que os estados e municípios participem da demarcação, indo contra outra lei, o Estatuto do Índio. O PL prevê, entre suas propostas, que a demarcação de terras dependerá de um marco temporal que só garantirá o direito das comunidades que comprovarem que estavam de posse efetiva da terra em 05 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. O que excluiria os parentes que lutam pela demarcação há muitas décadas ou que foram expulsos de seus territórios e que jamais realizariam o sonho de viver neles novamente.
O PL 490/2007 tem o interesse de impedir demarcações, suspender processos de reconhecimento em curso e mudar a gestão das terras indígenas, que deixariam de ser da União para uso nosso, para passar a permitir o desenvolvimento de atividades de exploração de recursos por terceiros, por não indígenas. Abre também a possibilidade de desenvolver atividades predatórias como a mineração, que só deixa poluição e doença por onde passa.
O PL 490/2007 não considera os direitos internacionais que possuímos e quer atropelar até mesmo o direito a sermos consultados em caso de empreendimentos que impactem nossas terras como barragem, estrada, ferrovia, exploração mineral e linha de transmissão de energia.
Esse PL 490/2007 é contra tudo o que conseguimos garantir com muita luta. E vem para enfraquecer as comunidades e criar problemas para o desenvolvimento do nosso modo de vida em um momento em que a preservação ambiental, das florestas e das águas, são importantes para toda a sociedade.
Queremos autonomia para cuidar coletivamente dos nossos territórios. Não queremos invasão, conflito, divisão e degradação ambiental.
Independente das opções políticas e partidárias, queremos dialogar com cada um dos senhores e senhoras em nome de centenas de povos e comunidades indígenas, não apenas de nosso estado do Acre, mas de todo o país, que se posicionam contra a tomada de nossas terras, o despedaçamento delas e a eliminação dos modos de vida tradicionais.
Lembramos às senhoras e senhores deputados e senadores, que nós indígenas somos eleitores. E estamos cada vez mais atentos àqueles que, longe de nossos olhares, decidem propor ou apoiar inciativas que ameacem os povos indígenas e a proteção da floresta.
Pedimos o seu posicionamento contrário às leis que ameaçam nossos direitos e seu voto contra o PL 490/2007.
Nenhum direito a menos!
Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá – OPIRJ
Organização dos Povos Indígenas de Tarauacá – OPITAR
Organização das Mulheres Indígenas do Acre, Sul do Amazonas e Noroeste de Rondônia – SITOAKORE
União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira – UMIAB
Organização dos Professores Indígenas do Acre – OPIAC
Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre – AMAAIAC
Federação do Povo Huni Kuĩ do Estado do Acre – FEPHAC
Associação dos Produtores e Criadores Kaxinawá da Praia do Carapanã – ASKPA
Associação Sociocultural e Ambiental Kuntamanã – ASCAK
Associação Kaxinawá do Rio Breu – AKARIB
Associação do Povo Jaminawa Arara do Rio Bagé – AJAB
Manxinerune Tshi Pukte Hajene (Manchinery de Grandes Aldeias) – MATPHA
Manxineryne Ptohi Kajpa Hajene (Organização do Povo Manchineri do Rio Iaco) – MAPKAHA
Associação Manchineri de Desenvolvimento Sustentável da Aldeia Nova União – AMDES
Associação Ashaninka do Rio Amônia – APIWTXA
Associação Agroextrativista Puyanawa Barão Ipiranga – AAPBI
Associação Indígena Nukini – AIN
Associação do Povo Indígena Nawa – APINAWA
Cooperativa Agroextrativista Shawãdawa Pushuã
Associação do Povo Shanenawa da Aldeia Shane Kaya
Associação Katuquina do Campinas – AKAC
Instituto Yorenka Tasorentsi
Associação dos Povos Indígenas Kaxinawa do Rio Humaitá – ASPIRH
Associação Sociocultural Yawanawá – ASCY