Uma comitiva com lideranças dos povos Kuntanawa, Nawa, Huni Kuĩ, Ashaninka, Puyanawa e Nukini, do estado do Acre, esteve em Brasília nos dias 18 e 19 passados, discutindo com órgãos e entidades do governo federal a demarcação das terras indígenas no estado e a gestão e proteção territorial na região do Alto Juruá. O grupo participou de reuniões com o Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
“Entre as pautas discutidas falamos sobre a regularização fundiária e a situação de crise nas terras indígenas devido a vários problemas como atraso do relatório [Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação de Terra Indígena – RCDI], vigilância da terra, impactos pela seca extrema em decorrência das mudanças climáticas. Pedimos que o MPI e MMA deem uma resposta comum para esses problemas, que os órgãos trabalhem em parceria”, explicou Railson Nawa, liderança da Terra Indígena Nawa, uma das cinco terras indígenas reivindicadas no estado que ainda estão na fase de estudos.
De acordo com Luiz Nukini, vice-presidente da Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (OPIRJ), uma das lideranças que esteve em Brasília, a série de reuniões faz parte das atividades de incidência política e articulação do projeto Gestão Territorial, que a OPIRJ executa com apoio do Fundo Amazônia. “A partir dessa rodada de reuniões, marcamos uma fase do nosso projeto, mas, ao mesmo tempo, esta ação corresponde às expectativas das lideranças de base da OPIRJ, que é formar uma conjuntura com atores governamentais e não governamentais que possam contribuir com o desenvolvimento dos nossos territórios, como também do entorno, do Parque Nacional da Serra do Divisor [PNSD], e dessa região de fronteira”, explica.
Durante as reuniões, a lideranças indígenas abordaram a necessidade de restabelecimento de pactos e fortalecimento das alianças, principalmente com o ICMBio. “É essa união dos órgãos que está faltando para resolver os problemas das nossas terras”, diz Ilson Nukini, liderança da aldeia Kampũ, TI Nukini. No MMA, os indígenas destacaram a necessidade de o ICMBio fortalecer a gestão das Unidades de Conservação, uma vez que a proteção da região do Alto Juruá passa por essa relação das Reservas Extrativistas (Resex) e Unidades de Conservação (UC) com as Terras Indígenas.
A coordenadora da Comissão Pró-Indígenas do Acre (CPI-Acre), Vera Olinda, e o antropólogo e conselheiro da CPI-Acre, Terri Valle de Aquino, participaram das reuniões e falaram sobre a gestão territorial integrada e os impasses que estão atrasando o processo de demarcação das terras indígenas no estado.
Das 36 terras indígenas que existem no Acre, 29 estão demarcadas. “No geral, o que falta para avançar na demarcação das últimas terras indígenas que foram reivindicadas é resolver o problema de sobreposição das áreas, o que não é difícil, pois todas são terras da União, não é tirar fazendeiro e grileiro da terra”, coloca Terri.
Terri explica que no Acre há a sobreposição da TI Nawa com o Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD), o mesmo acontece com a TI Nukini que reivindica a ampliação da área. Os Nukini são agora afetados pela Lei 14.701/2023 (Lei do Genocídio). A TI Jaminawa do Caeté está sobreposta a Resex Cazumbá Iracema, assim como o território Kuntanawa que está na mesma área da Resex Alto Juruá.
“Outra terra indígena, a Kaxinawá Seringal Curralinho, tem um entrave que é um projeto de assentamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária [INCRA]. Ou seja, os responsáveis pelas sobreposições são os órgãos federais, que vão ter que trabalhar para resolver”, completa Terri.
Um dos encaminhamentos propostos por Terri Aquino junto com as lideranças indígenas para resolução dos problemas de sobreposição é a criação de um Grupo de Trabalho (GT) Interministerial com MPI e MMA, e suas respectivas entidades Funai e ICMBio, para agir em conjunto na questão fundiária no Acre.
Vera Olinda destacou que um dos gargalos no Alto Juruá, incluindo os rios Tarauacá e Jordão, é a necessidade do trabalho de gestão integrada baseado nas relações entre as comunidades indígenas e extrativistas. “Construir e fortalecer novas alianças entre comunidades indígenas e moradores das Resex Alto Juruá e Alto Tarauacá é fundamental. A demarcação e a gestão dos territórios andam juntas e nesse sentido, o ICMBio deve contribuir e olhar para estas relações. É problemático ter terra indígena conservada e, ao lado, o desmatamento aumentando nas Resex, deixando as pessoas mais vulneráveis,” explica Vera.
No MPI, a comitiva se reuniu com representantes da Secretaria de Direitos Ambientais e Territoriais Indígenas e da Secretaria de Gestão Ambiental e Territorial Indígena, entre estes a Diretora de Departamento de Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato, Beatriz Matos e o Coordenador Geral de Desintrusão, Paulo Teixeira. Na reunião foram discutidas questões de segurança pública e proteção territorial na região de fronteira, com foco na proteção dos povos indígenas isolados, que estão sob fortes ameaças de atividades ilícitas na região, como o narcotráfico. As lideranças enfatizaram que para ter segurança há que ter terras indígenas demarcadas. Também colocaram a necessidade de efetivar medidas de segurança pública na região, com atenção à inclusão da proteção da região do Alto Juruá nas instâncias do Estado brasileiro que discutem e deliberam sobre segurança pública na fronteira Acre – Peru. (Comunicação/CPI-Acre)