José Marcondes Puyanawa em sua formatura com certificado de conclusão da formação de AAFI

Eu, José Marcondes Rosa Puyanawa, da Terra Indígena Puyanawa, aldeia Ipiranga, vou contar um pouco do meu trabalho como agente agroflorestal visando um futuro de sustentabilidade na segurança alimentar, fazendo o manejo dos recursos naturais extraídos do meio ambiente de forma sustentável. Durante dez anos trabalhando nessa luta defendendo a causa dos nossos recursos naturais, muitas dificuldades encontrei e superei para ganhar confiança da comunidade Puyanawa.

Fui apontado pela comunidade para trabalhar como Agente Agroflorestal na aldeia Ipiranga. Como não tinha experiência passei por muita dificuldade nos três anos iniciais, mas depois de começar a participar dos cursos de formação dos AAFIs em Rio Branco, no Centro de Formação dos Povos da Floresta, então foi aí que eu pude compreender o tamanho da importância e a responsabilidade que precisava ter com esse trabalho que a comunidade me deu.

Comecei a trabalhar juntamente com a comunidade buscando as parcerias com a educação, saúde, Aisan e as demais pessoas, principalmente as lideranças maiores como cacique e presidente da associação. Foi aí onde comecei a participar das reuniões, para ouvir o planejamento da comunidade, e onde eu podia dar minha contribuição no desenvolvimento dos trabalhos que eram feitos dentro da aldeia.

Tomei a iniciativa de mostrar o meu trabalho como Agente Agroflorestal dentro da comunidade, fazendo o monitoramento, conscientizando para que tivesse o manejo de cada recurso extraído do nosso meio ambiente. Na parte do monitoramento sou responsável por fazer o acompanhamento de cada animal silvestre que serve de alimento, como anta, veado, queixada, porquinho, paca, tatu, cutia, jabuti, várias espécies de macaco, nambu, jacu, arara, etc… Faço acompanhamento conscientizando para que cada chefe de família use esses recursos naturais de forma sustentável. Não fazendo caçada predatória, nem com armadilha, nem cachorro, somente para o alimento da família mantendo a segurança alimentar da comunidade.

Na parte da madeira, faço o acompanhamento de cada espécie extraída pelos responsáveis de família. Quando vai fazer uma extração de madeira, para construir sua casa, é necessário que cada um fale qual o objetivo dela, se é para fazer canoa, cerca de quintal. Para construir casa preciso saber quantas árvores vão ser derrubadas, quais as espécies e a quantidade de dúzia que vai ser tirado, porque tenho que prestar conta no final do ano para toda a comunidade.

Temos outra parte muito importante em relação à pesca. Não pode fazer pesca predatória nos lagos, igarapés, nem jogar tingui etc. Somente de uso exclusivo da comunidade para sua segurança alimentar. Cada família que extrai esses recursos, deve ser feito com o manejo sustentável dividindo as alimentações para a comunidade e os animais, como jacaré, cobra, lontra. Essa é a forma de trabalhar o manejo na parte de pesca.

Sobre o manejo dos roçados de mata nativa o trabalho é recuperar, porque nós trabalhamos com áreas mecanizadas, aproveitando as áreas que já foram desmatadas usando trator, arando para fazer os plantios de mandioca, feijão, em grande quantidade. Entre roçado, capoeira e área mecanizada, chegamos ao total de 70 a 75 hectares plantados entre as duas aldeias Barão e Ipiranga. Dentro desse trabalho faço o levantamento da quantidade de produção de farinha feita em 16 casas de farinha e chega ao total de 10.000 a 12.000 sacas de farinha anual.

Então faço esse acompanhamento anual de todos esses trabalhos feitos na aldeia para o controle de todos os recursos que são extraídos do nosso ambiente. Isso porque tenho que prestar conta no final do ano para as duas aldeias. Assim vamos saber se a comunidade está usufruindo dos recursos de forma sustentável ou está agredindo o meio ambiente, ultrapassando as regras feitas pelas duas aldeias, que é o Plano de Gestão Territorial e Ambiental da Terra Indígena Puyanawa.

Outro trabalho onde tenho ajudado a minha aldeia é no trabalho de viveiro para produção de mudas frutíferas. Nessa atividade, trabalho envolvendo os alunos da escola e professores para uma aula prática, construindo canteiro, sementeira, enchendo saquinho e plantando semente. Vejo que é um momento muito importante para estar compartilhando o meu conhecimento que aprendi e agora estou repassando para minha comunidade.

Tenho trabalhado com horta orgânica na escola junto com os alunos e professores, mostrando para eles qual a importância de uma horta, ensinando como faz canteiro, sementeira, como planta as sementes, quais os espaçamentos de cada espécie, quais os adubos que são usados na horta para ter uma produção de qualidade para alimentação. Então é mais um momento para compartilhar os meus conhecimentos para minha aldeia.

Trabalho em parceria com os agentes de saúde, ajudando na conscientização de cada família manter a saúde ambiental. Assim cada uma cavando fossas para jogar seu lixo não orgânico, como plástico, vidro, latas, pilha, etc. Quase todas as famílias fizeram isso. E o lixo orgânico, colocar nos troncos das árvores, que serve de adubo para as plantas. Nosso cacique buscou parceria com a prefeitura do município para dar apoio nessa parte. Então agora vem um caminhão do município e faz toda coleta do lixo da comunidade e leva para o lixão do município.

Outra coisa que eu também faço é conscientizar a não jogar lixo dentro do nosso igarapé, nem cacimba, evitando qualquer contaminação tóxica, para não prejudicar nossa saúde, nem os animais do nosso ambiente, por isso foram construídas várias caixas de lixo na aldeia. Porque todo lixo é muito perigoso para a saúde da humanidade e o meio ambiente. Essa é mais uma das minhas contribuições nos trabalhos de Agente Agroflorestal como parceiro na parte da saúde ambiental dentro da comunidade. Explicando o que pode acontecer se não tiver cuidado com o lixo, assim como as doenças e que podem chegar até à morte se não cuidar.

Vigilância e fiscalização é outra parte fundamental que tenho acompanhado. Quase todas as vezes que são feitas as vigilâncias dentro da Terra Indígena, tanto na parte fluvial como terrestre. Nossa TI é muito afetada pelos moradores do entono, tanto na parte de caça, como pesca e até mesmo retirada de madeira. Por esse motivo se faz necessário a comunidade estar se organizando em grupos, para vigiar quais os lugares mais afetados pelos invasores, como caçada com cachorro, armadilha, tirada de madeira.

Na parte fluvial são muitos invasores pescando de forma irregular nos lagos, como retirada de capim, balseiros, uso do espeto etc. Por esse motivo precisamos estar sempre vigiando esses lugares mais afetados. Porque eles fazem tanto pesca como caça predatória. Mas para amenizar esses problemas precisamos fazer a fiscalização juntamente com a FUNAI e a Policia Federal, que são os órgãos responsáveis pela Terra Indígena. Nessa parte de fiscalização, com os órgãos competentes, já aconteceram várias apreensões como espingarda, caça, madeira.

Tenho trabalhado também na reabertura da picada, junto à comunidade, participo de todas as atividades. Quando estou na aldeia, desde os trabalhos internos às reuniões ordinárias e extraordinárias, estou junto. Nas festas tradicionais e espirituais do povo, participo das bebidas, comidas típicas, tenho um amor imenso pela minha cultura e valorizo minha identidade.

Esse é meu trabalho que venho desenvolvendo como Agente Agroflorestal Indígena contribuindo com meus conhecimentos, retribuindo toda a confiança que me foi dada para trabalhar como mais um parceiro de luta para o desenvolvimento de gestão ambiental e territorial da minha Terra Indígena Puyanawa.

Fonte: http://pagina20.net/v2/meu-trabalho-de-agente-agroflorestal-indigena-na-aldeia/