Teve início nesta terça-feira, 30, e segue até esta sexta, 03, a Reunião Anual da Força Tarefa de Governadores para Clima e Floresta (Governors’ Climate and Forests Task Force/ FT-GCF), na cidade de Florência, Caquetá, Colômbia. O encontro que acontece há 11 anos tem como tema “Novas Fronteiras na Governança Florestal: promovendo investimentos, protegendo a Biodiversidade, Melhorando os Meios de Vida’’
A Força Tarefa é uma colaboração subnacional que nasceu em 2008 pelo acordo entre nove estados e províncias e hoje conta com 38 estados e províncias no Brasil (Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Maranhão, Mato Grosso, Rondônia, Roraima e Tocantins), Indonésia, México, Nigéria, Peru, Espanha, Colômbia, Equador, Costa do Marfim e Estados Unidos que, juntos, somam mais de um quarto das florestas tropicais do mundo.
Do Brasil, participam do evento as organizações indígenas Associação dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIAC), Organização dos Professores Indígenas do Acre (OPIAC) e Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (OPIRJ), o Conselho Indigena de Roraima (CIR) e a Federação dos Povos e Organizações Indígenas do Mato Grosso (FEPOIMT), além da ONG indigenista Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-Acre). Com exceção da FEPOIMT OPIRJ, todas organizações são membros da Rede de Cooperação Amazônica (RCA), que também acompanham a agenda por meio da sua secretaria executiva.
A primeira atividade do GCF foi a reunião do Comitê Global de Povos Indígenas e Comunidades Locais. Esse espaço foi conquistado em 2017 após um histórico de mobilizações que vem desde a Declaração de Rio Branco (DRB), em 2014. Entre outras coisas, a DRB reconheceu a importância da inclusão dos povos indígenas e comunidades locais nos espaços de tomada de decisão e comprometeu os governos signatários a reduzir o desmatamento em 80% até 2020.
Ainda na terça-feira foi realizada a oficina ‘’Melhores Práticas para fortalecer a Colaboração entre Governos Subnacionais, Povos Indígenas e Comunidades Locais”, promovida pelo Earth Innovation Institute (EEI), Instituto de Mudanças Climáticas e Regulação de Serviços Ambientais do Acre (IMC), Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIAC) e Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-AC). Esta foi uma oportunidade para indígenas do Acre e Mato Grosso (Brasil) e Ucayali (Peru) exporem os aprendizados em seus estados que envolvem estas populações nas políticas de mudança de clima.
A experiência brasileira com a Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial (PNGATI) também foi destaque na programação oficial do GCF. Reforçando a participação da Sociedade Civil, Sinéia do Vale, do Conselho Indigenista de Roraima (CIR), apresentou a PNGATI na mesa ‘’Governança Colaborativa em Prática: construção de Estado entre Organizações Indígenas e Governos Locais’’, organizada pela ONG Gaia Amazonas, da Colômbia, com apoio da Rede de Cooperação Amazônica (RCA). A cobrança dos indígenas aos governantes é que a PNGATI seja fortalecida nos seus estados.
Em diversos momentos estratégicos ao longo do Comitê Global, as lideranças indígenas pautaram a importância da efetivação dos compromissos firmados pelos governantes e de uma maior abertura para o diálogo com as comunidades.
No dia 1º de maio, na reunião oficial, com a presença de governadores e delegados dos Estados membros, Francisca Arara e Tuntiaak Katun Jua, Vice-Presidente da Coalisão de Organizações Indígenas da Bacia do Rio Amazonas (COICA), ambos representantes do Comitê Global, fizeram pronunciamentos nesse sentido.
“Estou aqui para lembrar os governadores que vocês aderiram a Carta de Princípios de São Francisco e ela fala como os governadores tem que dialogar, consultar e respeitar os povos indígenas em seus estados. A Carta deve nortear as ações e isso não se pode perder de vista”, disse Francisca Arara, secretária AMAAIAC e coordenadora da OPIAC.
Na Carta de Princípios Orientadores para Colaboração e Parceria entre Governos Subnacionais, Povos Indígenas e Comunidades Locais, citada por Francisca, os governos subnacionais reconhecem, em respeito ao direito de consulta livre, prévia e informada, os direitos à terra e ao território, à autodeterminação, à auto governança e aos saberes culturalmente diferenciados. Os governos também assumem que os povos indígenas e as comunidades locais exercem papel de liderança na implementação de ações para a conservação da biodiversidade e das baixas emissões de gases de efeito estufa.
Povos indígenas no GCF
A grande proposta do GCF é que todos os agentes (sociedade civil, governantes e instituições não-governamentais) discutam e busquem soluções para a mitigação das mudanças do clima. Nesse contexto, lideranças indígenas propuseram em 2018 durante reunião em Rio Branco a criação de um Comitê Regional Indígena da Amazônia Brasileira, com os nove estados brasileiros, que dialogue com o Comitê Global nas Reuniões Anuais do GCF.
Na Reunião Anual na Colômbia, os indígenas voltaram à proposta do Comitê Regional. “Nós, povos indígenas, temos experiências longas. Precisamos fazer uso dessas experiências para sair com uma ideia concreta e operacionalizar essas questões. No Brasil, somos nove estados e várias organizações representativas que juntas podemos pensar melhor as questões regionais para levar para o Comitê Global”, explica Francisco Piyãko, durante sessão de trabalho.
Ele acrescenta que a composição de um Comitê Regional vai facilitar as decisões e torna-las mais coerentes com as necessidades das populações indígenas. “Nós precisamos, enquanto comunidades indígenas, decidir o que vai ser pensado sobre nossas vidas. Sem isso, esse trabalho corre o risco de estar desconectado da nossa realidade”, diz Piyãko.
Para a liderança Ashaninka, um dos principais desafios do Comitê Global dos Povos Indígenas e Comunidades Locais é dar continuidade aos processos decididos nas reuniões anteriores. “O que discutimos aqui ultrapassa a eleição e governo, mas quando muda o governo, pode mudar muita coisa. Por isso é importante que estejamos fortalecidos”, finalizou.
Investimentos no Acre
Por meio do Sistema de Serviços Ambientais do Acre (SISA), o estado do Acre captou nos últimos anos financiamentos internacionais para implementação dos Planos de Gestão Territorial e Ambiental (PGTAs), capacitação e remuneração dos agentes agroflorestais indígenas (AAFIs) e formação de lideranças em temas de mudanças climáticas e serviços ambientais.
Juntos, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e bancos internacionais, como o Banco Mundial e o banco alemão KFW, investiram cerca de 29 milhões em recursos que estão disponíveis para serem aplicados pelo atual governo em ações econômicas, sociais e culturais, que entre outros resultados, visam a obtenção de uma economia de baixo carbono, a inclusão social dos povos da floresta e a redução do desmatamento.
“Nós tivemos uma paralização das políticas já construídas no estado do Acre para povos indígenas, mas na reunião do GCF Brasil que aconteceu em Macapá, o governador e o secretário do Meio Ambiente puderam ver a importância desse trabalho e o que nós temos feito para a regularização do clima”, explica Francisca, reforçando o papel do Instituto de Mudanças Climáticas do Acre (IMC) como um canal que vem mostrando a relevância dessas políticas para estado.
“Se existe floresta tropical no mundo é onde nós indígenas existimos. Nós cuidamos da floresta não só para nós, mas para todo o planeta. A nossa preocupação é como os recursos financeiros vão ser aplicados. Nós temos força, coragem e sabemos que o governo tem que estar aberto para diálogo, assim como nós estamos”, enfatizou Francisca, no seu pronunciamento oficial para todos os participantes da Reunião Anual do FT-GCF.
A capital do Amazonas, Manaus, foi escolhida para ser a próxima sede da reunião anual do FT-GCF, que acontecerá em 2020. O principal argumento para a escolha, apoiado por todos os membros do GCF, é de que há um cenário político desfavorável em relação às políticas indigenistas e ambientais no país, a nível federal. A reunião anual no Amazonas será uma oportunidade para fortalecer as iniciativas dos Estados que querem desenvolver políticas socioambientais jurisdicionais.
Por Leilane Marinho com colaboração de Estevão Ribeiro