“Usamos a floresta com muita sabedoria porque é da terra que tiramos o nosso sustento”, explica Lucas Sales Kaxinawá, Agente Agroflorestal do povo Huni Kuῖ, e autor de uma das cinco monografias que serão concluídas no XXI Curso de Formação de Agentes Agroflorestais Indígenas deste ano, que acontece entre os dias 13 de julho e 12 de agosto, no Centro de Formação dos Povos da Floresta (CFPF), da Comissão Pró-Índio do Acre CPI/AC .

Nesta edição do curso participam 29 Agentes Agroflorestais Indígenas (AAFIs), representantes de 15 terras indígenas e sete povos: Jaminawa/Arara, Shawãdawa, Katukina, Kaxinawá, Manchineri, Puyanawá e Yawanawá. Nesta sexta-feira, dia 7 de agosto, acontecerá a formatura de cinco AAFIs Huni Kuῖ – Lucas Sales,  Francisco Rosenir Txanu, Raimundo Paulo Ixã, Valdo Pereira Shane e Amiraldo Sereno Yãki.
Com o patrocínio da Petrobras, por meio do programa Petrobras Socioambiental, o curso realizado pela Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-Acre) conta com a parceria da Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIAC), e com o apoio da Fundação Nacional do Índio (FUNAI).
Renato Gavazzi, coordenador pedagógico do curso explica que ele foi pensado como uma ação educacional para a gestão dos territórios indígenas: “Propiciamos a discussão relacionada ao uso e a conservação dos recursos naturais. Os AAFIs também são responsáveis em discutir os seus planos de gestão”. Ele explica que nos cursos “são desenvolvidas atividades com a proposta de formar indivíduos que atuem na implementação e no manejo de diferentes modelos agroflorestais dentro do principio da agroecologia nas terras indígenas, e fortalecendo os processos de gestão territorial e ambiental em suas comunidades”.
As aulas possibilitam a troca de saberes entre os Agentes Agroflorestais e a equipe da CPI-Acre em diversas áreas do conhecimento como agrofloresta, avicultura, informática meliponicultura, matemática, arqueologia, ecologia indígena,  cartografia indígena, além de promover o uso de GPS para o monitoramento ambiental. São realizadas atividades de implantação e manejo de horta orgânica, que são modelos demonstrativos do Centro de Formação. Nas aulas de Arte e Ofício, os AAFIs confeccionam esculturas que representam mitos indígenas e aspectos da natureza reaproveitando madeira.
Armédio Carneiro Alvez, Agente Agroflorestal do povo Katukina, de 34 anos, que vive na aldeia Varinawa, na Terra Indígena Campinas/Katukina, acredita que o “papel do AAFI é trabalhar com o plano de gestão territorial e a vigilância da terra indígena. Também temos que fazer articulação política, reuniões na comunidade e educação ambiental”.
“Não é só plantar, fazer viveiros e manejar. Tem que trabalhar na orientação e conscientização da comunidade”, explica o AAFI Erivaldo Sérgio ou Bina Huni Kuĩ (nome indígena), de 32 anos, que mora na aldeia Pinuya, na Terra Indígena Colônia 27. “O nosso projeto é ver todas as famílias trabalhando com sistemas agroflorestais, avicultura, piscicultura e frutíferas. Esse é o meu sonho, o meu povo feliz e com riqueza de alimentos”, completa.
Desde a sua criação em 1994, o Centro de Formação dos Povos da Floresta deu aos Agentes Agroflorestais Indígenas a possibilidade deles experimentarem novas práticas de manejo sustentável dos recursos naturais, alem de valorizar e recuperar as práticas tradicionais no manejo da paisagem. “O surgimento do curso de formação também está relacionado com a criação do Centro de Formação. O primeiro curso aconteceu em 1996, dois anos após a compra do sítio. A gente pegou uma área muito degradada, que era pasto, e em quase 20 anos ela foi quase totalmente reflorestada com a implementação de SAFs pelos AAFIs”, lembra Renato Gavazzi, explicando que a agrofloresta não pode ser ensinada apenas através de um discurso: “é necessário ter uma prática. Temos aqui algo materializado que é uma floresta produtiva que foi implementada e manejada por nós. Aqui temos um manejo específico, que não pensa só na produtividade. A gente pensa também na paisagem, para criar um lugar agradável e bonito oferecendo alimento e moradia para os animais. O  tucano tem o direito de colocar o seu ninho num pau velho de uma árvore”.
O coordenador pedagógico do curso também acredita que um dos resultados da formação é ver hoje muitas das terras indígenas do Acre com seus quintais e sistemas agroflorestais, com enriquecimento das capoeiras, e com produção e manejo de quelônios, por exemplo. “O desafio é continuar trabalhando no fortalecimento dos povos indígenas para que tenham autonomia para discutir os seus territórios, e para que possam implementar modelos de desenvolvimento relacionados ao seu próprio contexto”.